Como redes de fungos mudaram o planeta

Há cerca de meio bilhão de anos, muito antes dos seres humanos começarem a construir estradas para o transporte e comércio de recursos, a natureza desenvolveu uma rede de transporte semelhante que alterou radicalmente o planeta. Essa rede facilitou a colonização do ambiente terrestre pelas plantas, anteriormente confinadas ao meio aquático, e foi responsável pela formação dos solos e da atmosfera que sustentaram a evolução da vida como a conhecemos.

Um artigo que saiu recentemente na Nature investiga mais a fundo essas relações.

Essa rede natural é composta por fungos micorrízicos, em especial os arbusculares, que estabelecem uma relação simbiótica com as raízes das plantas, promovendo a troca de nutrientes essenciais, como nitrogênio e fósforo, por açúcares provenientes da fotossíntese vegetal. No entanto, esses fungos se deparam com um dilema muito grande, que é um conflito entre gastar energia para construir mais redes e balancear isso com os custos que explorar maiores áreas tem. Como os fungos encaram esse desafio ainda é algo que não está claro.

Principalmente, por conta da natureza oculta desses sistemas a sua investigação científica é sempre dificultada. Os avanços científicos e tecnológicos permitem, no entanto, trabalhos como esse publicado na Nature, em que eles acompanharam ao longo do tempo mais de 500000 nós fúngicos e mediram mais de 100000 fluxos citoplasmáticos dentro dessas redes.

Estudos indicam que as redes micorrízicas crescem a partir das raízes das plantas com uma regularidade espacial e temporal, com um crescimento em “ondas”. O artigo sugere que uma “onda líder” de pontas hifais se expande a partir da raiz e preenche um espaço, transportando nutrientes do solo para a planta enquanto obtém açúcares para manter e expandir a rede fúngica.

O fenômeno de onda viajante, um fenômeno observado em bactérias e outros microrganismos, mas nunca antes documentado em fungos simbióticos. Esses fungos crescem como uma onda singular de micélio que preenche os espaços, composta por duas populações :

(1) pontas de hifas em crescimento que lideram a onda como um pulso no espaço; e

(2) filamentos hifais que densificam o espaço na esteira do pulso em avanço.

Esse padrão foi confirmado por medições que mostraram que a densidade dos filamentos hifais que vem depois da frente da onda se estabiliza em um valor constante ao longo do espaço, enquanto a velocidade da onda permanece independente do tempo.

À medida que os nutrientes se esgotam nas regiões de contato do fungo (zona de depleção), a arquitetura da rede e os fluxos citoplasmáticos se ajustam para estimular a expansão, o que vai contribuir para aumentar oportunidades de colonização e de troca com outras plantas, uma vez que a rede encontre novos recursos e raízes. Esse modelo de crescimento complementa outras teorias sobre a estruturação das redes micorrízicas, como aquelas que analisam os caminhos ótimos de transporte e a arquitetura micelial em larga escala.

Além disso, um dos maiores desafios na compreensão dessas redes é identificar qual parceiro da simbiose regula as trocas de nutrientes. Enquanto algumas teorias sugerem um mecanismo baseado em um mercado de oferta e demanda, estudos recentes indicam que a regulação ocorre predominantemente pelo próprio fungo, já que alterações na biomassa radicular ou no crescimento das raízes não afetam significativamente a estrutura da rede fúngica.

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